Qual imagem mental se forma quando pensamos em visualidades? Em um mundo regido pela linguagem visual, parece que tudo e todos se transformam em representações do real. Filósofos e críticos da arte como Walter Benjamin e Susan Sontag já buscaram compreender a presença de imagens na vivência humana, apontando características de sua natureza técnica, seus desdobramentos na cultura e na ética, e suas potencialidades estéticas e políticas. Absorvidos pela tecnologia de informação, pela comunicação digital e por lógicas cada vez mais complexas de interação humana no mundo contemporâneo, fica o questionamento: que imagens estão sendo produzidas sobre nós? De que maneira nossos corpos e identidades são representados pelo outro e por nós mesmos? O que e quem essas imagens e representações (mediadas muitas vezes pelas mídias sociais) permitem ver?
Esses são alguns questionamentos que a edição 31 da Curinga Dossiê busca responder. Trata-se da terceira edição pensada exclusivamente para os meios digitais, além de realizada de forma totalmente remota devido às restrições da pandemia de Covid-19. Com nove produções, dentre as quais seis grandes reportagens multimídia e três especiais, o dossiê traz como tema “Visualidades: tecnologia, corpo e identidade”, sendo estes os conceitos que atravessam os textos, áudios, vídeos e infográficos, assim como as fotografias, ilustrações e entrevistas, de formas múltiplas em seus subtemas, ganchos e abordagens.
Como tradição, há três editorias. “Eu no mundo”, focada na relação do sujeito com o seu entorno, aqui presente em uma reportagem sobre os relacionamentos online, onde os afetos são mediados pelas imagens, e outra sobre a relação entre auto-imagem, padrões de beleza e influenciadores digitais. “Mundo em Mim”, voltada a discutir como o mundo imprime mudanças ao sujeito, apresenta uma investigação sobre influenciadores digitais mirins e trabalho infantil na internet, além de uma reportagem sobre a moda como lugar de resistência. “Travessia”, que funciona como síntese das reflexões internas e externas, traz uma discussão sobre dismorfia corporal, olhando ainda para os memes como forma de falar sobre saúde mental, e ainda, uma reportagem sobre a influência dos algoritmos de recomendação na exportação cultural coreana.
A equipe de editores produziu conteúdos especiais. A entrevista, desta vez, foi com a historiadora e comunicadora Giovanna Heliodoro, que falou sobre a construção de sua própria narrativa como mulher trans e preta nas mídias sociais, onde a visualidade ocupa um lugar de destaque. Dando sequência ao movimento da edição anterior, foi produzido um novo podcast em quatro episódios, desta vez, sobre a invisibilidade da pobreza menstrual, que teve também uma live com a ginecologista e obstetrícia Olívia Ferreira no dia 3 de dezembro, disponível em nosso canal no Youtube. Por fim, refletindo ao mesmo tempo a temática da edição e os próprios processos pelos quais a equipe do dossiê vem passado no período remoto, a fotorreportagem apresenta representações visuais da dependência em tecnologias digitais, contando com um casting formado por alguns dos integrantes da edição.
A Curinga Dossiê segue expandindo sua abordagem multimídia dentro da proposta da grande reportagem e produções de teor documental, visando tratar de pautas interessantes e relevantes e, mais uma vez, refletindo o momento pelo qual passamos. Assim, se consolida enquanto marca editorial, promovendo o jornalismo de qualidade apesar das adversidades do tempo presente e por fim, firma seu lugar como produção laboratorial aberta ao debate e fechada ao preconceito, como afirma seu slogan há 10 anos.
Kaio Moreira Veloso