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| Foto: Samuel Almeida

Lenta conquista

Fundadores do Instituto DH, em Belo Horizonte - MG,
discutem possíveis caminhos para a efetivação dos direitos humanos no Brasil

Alice Carpes, Bruno Willems, Tailane Aparecida e Samuel Almeida 
agosto, 2023

O Instituto DH: Promoção, Pesquisa e Intervenção em Direitos Humanos e Cidadania nasceu em 2007 e está localizado na cidade de Belo Horizonte, tendo a dupla João Batista e Emília da Silva entre os fundadores. Segundo João, ele e Emília, pelas trajetórias pessoais e atuação social, recebiam muitos pedidos de ajuda nas questões que envolviam os direitos humanos e perceberam a necessidade de criar uma entidade que pudesse trabalhar mais na visibilidade e na articulação dessa luta. Na década de 1980, João e Emília se conheceram em uma pesquisa de campo em Uberlândia - MG, que tratava sobre questões de movimentos sociais na defesa dos direitos humanos. Em seguida, foram trabalhar na Fundação do Movimento Direito e Cidadania, na capital mineira.

O Instituto foi criado como uma organização não governamental (ONG), sem fins lucrativos, que tem como objetivo principal contribuir para o exercício universal dos Direitos Humanos. Além de promover assistência para pessoas em vulnerabilidade social, oferece formação e realiza pesquisa sobre a temática, dentre tantas outras atividades, como a elaboração de projetos que buscam garantir a dignidade humana.

Por ser uma instituição sem fins lucrativos, a obtenção de recursos financeiros é uma das dificuldades enfrentadas. Para manter as atividades, são realizadas parcerias e, principalmente, trabalhos voluntários e contribuições monetárias de associados.

Maria Emília da Silva

Mestre em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela Escola Superior Dom Helder Câmara; graduada em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com especialização em Direitos Humanos no Centro de Estudos Superiores da Companhia de Jesus (CESC) Brasil. Começou a atuar na defesa dos direitos humanos por meio da vida religiosa, como integrante da Ação Católica Operária (ACO). Em seguida, passou a trabalhar no sistema prisional e, depois, diretamente com os direitos humanos. Agora em 2023, Maria foi uma das nomeadas para a Comissão de Anistia, órgão de assessoramento direto e imediato do Ministério de Estado dos Direitos Humanos e da Cidadania do Governo Federal.

João Batista Moreira Pinto

Tem graduação em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mestrado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e doutorado e pós-doutorado em Direito pela Universidade Paris Nanterre. É professor de Direito desde 1991, atuando nas áreas de Teoria do Direito e Direitos Humanos. Quando jovem, começou a trabalhar no auxílio à população em situação de rua. Foi assessor jurídico na Pastoral dos Direitos Humanos e consultor do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Belo Horizonte (1993) e do Fórum Estadual Lixo e Cidadania (2011-2013).

Diferente da concepção original de direitos humanos, o Instituto DH acredita que direitos humanos são um projeto de sociedade. Poderiam falar a respeito?

 

JOÃO BATISTA:

Foi durante o doutorado que comecei a pensar muito nessa ideia dos direitos humanos como projeto de sociedade, algo atualmente compartilhado por nós no Instituto. Entretanto, não é algo que surgiu do nada, o projeto é uma decorrência.

Podemos utilizar o surgimento da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, como exemplo. O que é a Declaração Universal? Eu tenho um conjunto de direitos que aparecem, como o direito à liberdade, à vida, à liberdade religiosa, à propriedade, assim como o direito à saúde e à educação.

E de onde surgem esses direitos? Por que houve esse reconhecimento dos estados na própria ONU? Porque isso também foi decorrência das lutas sociais de séculos anteriores, em que se lutava pela ideia da defesa e liberdade do indivíduo frente ao Estado, o que relacionamos a uma perspectiva liberal, que se liga com o direito à propriedade. Houve um período no qual as pessoas puderam comprar propriedades, que foram concentradas nas mãos de poucos. Muitas pessoas trabalhavam, mas não tinham propriedade.

Essa situação de extrema desigualdade é parecida com a que temos hoje no Brasil.. Então, como é que eu falo, por exemplo, de direito à propriedade, quando a pessoa, na verdade, precisa lutar com muita dificuldade para ter alguma coisa? A maioria da população não tem uma uma propriedade adequada e, quando tem, precisa pagar aluguel pois não consegue comprar. Então, quando se afirmou o direito à propriedade e à liberdade, seguia-se uma perspectiva liberal.

Quando eu falo de direitos humanos como projeto de sociedade, é porque eles integram valores do liberalismo, como por exemplo o direito à vida e o direito à liberdade. E claro que é importante. Democracia é importante, a liberdade é importante, claro que é. Porém não é só liberdade, mas liberdade com igualdade efetiva, não só no papel.

Após tantas mudanças no mundo, a tecnologia trouxe um novo cenário para a realidade. Apesar de facilitar a vida e o contato entre as pessoas, também impulsionou ataques e violências no meio digital. Neste contexto, de que modo as redes sociais podem atrapalhar e intensificar a garantia dos direitos humanos?

MARIA EMÍLIA:
Com a  rapidez da evolução de redes sociais, nós enquanto Direitos Humanos, parece que estamos correndo atrás, não só nós, as instituições. Eu tomo o período do isolamento pela Covid-19 como um marco, pois tivemos que atuar bastante através de redes. Não tinha outra forma, além das plataformas, como o Meet e o Zoom. Graças a esse esquema, o programa de defensores não parou. Nós não paramos de atender e não paramos de fazer reuniões de rede. É uma tecnologia que veio pra ficar, porque mesmo com o fim do período de isolamento, a gente continua tendo atividades através das plataformas, como seminários, oficinas, encontros e atendimentos a defensores.

Contudo, ao mesmo tempo que isso é um avanço, poupa tempo e agiliza - porque você consegue falar com várias pessoas ao mesmo tempo -, é também uma situação de vulnerabilidade. Estávamos em um evento do Instituto na época da pandemia e a plataforma que usávamos foi hackeada de forma brutal. Nós tivemos que suspender na mesma hora, foi uma situação bem desagradável. Acho que foi até em uma fala sua [João] que começou. Eles tomaram o nosso áudio, você não conseguia falar. Não conseguíamos falar, pois outro deles [um dos hackers] pegava o áudio para falar. Eles dominaram o evento, a gente teve que encerrar por ali. E desde então - isso foi em 2021 - nós estamos correndo atrás, pra descobrirmos como tudo aconteceu.

Quando eu digo das instituições, a própria delegacia parece que não sabia. Eu ia em uma delegacia e me diziam que não era ali, que eu deveria ir na delegacia de crimes cibernéticos. Aí eu ia lá e a situação se repetia, com novas justificativas. ‘Você tem que ir na delegacia mais próxima onde aconteceu o evento.’ Eu então explicava que o evento era nacional, que havia pessoas de outros estados.  ‘Não, vai na delegacia mais próxima de onde é a sede do Instituto.’ 

Eu então fui na delegacia aqui mais próxima. Como fomos, eu e o Álvaro, que era um outro motorista, eles jogaram a denúncia como se fosse um crime racial. Eu tive que voltar atrás e dizer que não era. ‘Mas de onde foi a ofensa?’ [perguntaram]. Eu falei: ‘eu não sei dizer, o evento era nacional’. Só pra você ter uma ideia da dificuldade que a gente tem. Quando tudo vai bem, é bom. Mas quando surge uma situação como essa de hackeamento...

As próprias instituições ainda não têm muita clareza de como começar a agir e onde buscar o responsável por isso. Faz uns dois meses que a gente terminou de encaminhar tudo que eles pediram para nós. É uma situação que eu acho ainda muito nova para que tenhamos uma eficácia, principalmente na busca dos responsáveis por situações como o hackeamento.

Agora você imagina se há uma invasão no atendimento de uma pessoa que está sendo ameaçada. Ela pode sofrer consequências muito sérias. Então, em casos mais sérios de ameaça, normalmente  fazemos a conversa de forma pessoal. Você tem que voltar à moda antiga pra você garantir segurança. Eu ainda não tenho ideia de como vai ser daqui para frente a ação a partir de redes e de plataformas com garantia e segurança, que ainda não temos.

Há muitos desafios para efetivação dos direitos fundamentais no Brasil. Quais as principais violações que precisam de um olhar mais atento e tem mais urgência de serem combatidas nesses próximos 4 anos?

MARIA EMÍLIA:
Eu fico pensando a dificuldade que a gente tem de saber qual é o povo mais vulnerável. Aqui eu consideraria os indígenas, pois é o povo originário dessa terra, que foi sendo cada vez mais desqualificado e mais espoliado daquilo que é próprio deles. A floresta é vida para eles; a floresta está sendo destruída. A terra é vida para eles; eles não têm terra. O ambiente está sendo destruído.

Quando falamos de marco temporal, a primeira ideia que vem à cabeça é o indígena, demarcação coletiva da terra. Junto a eles estão também os povos quilombolas, uma parcela grande da população que também está na luta reivindicando um território. Se avançamos um pouco mais, temos os povos ribeirinhos e geraizeiros, comunidades tradicionais que parecem ter surgido de repente, mas que sempre existiram.

Para mim, seria assim, numa escala, a luta dos povos indígenas, que não está dissociada da luta dos quilombolas, que buscam pela defesa e manutenção do território; e aí vêm os povos tradicionais também. Se vamos mais adiante, juntam-se aqueles que moram nas periferias, os sem-teto urbanos e a luta do MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra]. A questão indígena se associa à questão quilombola e à questão dos povos tradicionais. Aí vem moradores de rua, os sem terra e os sem teto.



JOÃO BATISTA:
Na verdade, na realidade brasileira, eu vejo que as pessoas pobres, de forma geral, precisam de todas as lutas. Os indígenas possuem uma boa articulação política. Eles têm vulnerabilidade, mas se articulam politicamente, têm grupos. Mesmo os quilombolas, em determinados momentos também conseguem. Mas a pessoa quando é pobre não tem articulação política, não sabe votar. Ela não tem nada, só está preocupada com que vai comer amanhã, ou hoje mesmo.

O problema maior é esse, que não é pouco, em termos de milhões no Brasil. Então é essa a maior fragilidade. Porque quando a pessoa é muito pobre, ela realmente não tem consciência política nem interesse. Como é que ela é moderna? Ela está preocupada com o que vai comer amanhã. E isso são milhões de pessoas no Brasil. Então, a meu ver, um grande problema que é relacionado a direitos humanos, mas que precisa ser resolvido primeiro, é isso. Se eu tenho isso que afeta um grande número de pessoas negras, mulheres, porque tem várias lutas, todas são importantes.

Em uma das reportagens que estão neste dossiê da Curinga, o discurso religioso aparece como pretexto para grupos políticos violarem direitos. Contudo, a religiosidade também tem a potencialidade de buscar garantias universais a partir de princípios como empatia, amor ao próximo, caridade, entre outros…

MARIA EMÍLIA:
A vida religiosa era uma instituição criada para questionar a sociedade acerca das deficiências que havia nas políticas públicas, no atendimento às populações, às mulheres, às mães, aos trabalhadores. Na época em que eu participei [da vida religiosa], a partir de 1981, ela tinha uma função muito maior de questionar a sociedade. Talvez tenha mudado ultimamente e percebemos um maior questionamento sobre a religião. Se ela se fecha na área da educação, da saúde, deixa de estar no meio do povo, sentindo as dores e as necessidades das pessoas.

Embora eu acredite que isso também venha da minha família, a vida religiosa me introduziu em uma linha mais política de organização da sociedade. Então, eu acredito que essa é a motivação maior que me faz estar nesse lugar aqui, de defesa de direitos humanos. Atuei nos movimentos de ACO, que é a Ação Católica Operária, Movimento de Trabalhadores Cristãos, muito voltados para uma ação mais política. Depois, mais recentemente, entrei no grupo de movimentos negros, em grupos de trabalho de luta pela terra -  que cresceu muito. Atuei desde quando havia as pequenas ocupações com a CPT [Comissão Pastoral da Terra], que existe até hoje, isso passou pelo MST. Eu atuei muito na linha ainda, quando era operário de fábrica, de indústria. Hoje nós temos outra característica dos trabalhadores, e vamos nos engajando a partir da necessidade que vem de fora para dentro. Então eu acredito que essa é a motivação maior que me faz estar nesse lugar aqui de defesa de direitos humanos. 



JOÃO BATISTA:
Acabou que eu também fiquei um tempo pensando em entrar para a vida religiosa, fiquei um ano e depois saí. Foi nesse tempo que comecei a trabalhar com população de rua. Quando comecei a pesquisar, e fazer o mestrado, por exemplo, a minha ideia era trabalhar sobre a compreensão e a noção de justiça nos movimentos sociais. E tem a ver um pouco com isso que a Emília está falando, era nesses grupos que essa luta por direitos e por direitos humanos acontecia, não é? Tantos grupos que tinham essa noção e vinculação com a questão religiosa e outros que não.

Mas, então, tinha esse ponto comum de luta por direitos humanos. Minha trajetória é um pouco ali. Depois, mesmo a minha pesquisa em direitos humanos, desde como professor, foi sempre nessa perspectiva de trabalhar com questões teóricas e vinculadas, nos últimos anos, à questão de direitos humanos e direitos humanos como um projeto de sociedade, vamos dizer assim.

Nesta edição da Curinga, também falamos sobre o direito à terra, destacando as diversas lutas no Brasil por essa causa. Lutas que, muitas vezes, acabam em morte. O Instituto trabalha no apoio aos defensores dos direitos humanos. Em Minas Gerais, a Lei nº 21.164 de 2014, institui o Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos de Minas Gerais (PPDDH-MG) e, dentro dele, há o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas, do qual Emília é coordenadora. Poderiam falar mais a respeito?

MARIA EMÍLIA:
O Programa foi criado pensando em proteger os defensores dos direitos humanos que estavam ameaçados. Para mim, já contemplava os ambientalistas e os comunicadores, só que a partir de 2016 eles acrescentaram, com o nome de “Programa de Proteção a Direitos Humanos, Ambientalistas e Comunicadores Ameaçados”. Porque houve muitas mortes de comunicadores, de jornalistas, e ambientalistas nem se falam. Não foi um acréscimo muito positivo, porque senão você teria que colocar outros lutadores também, que são defensores e que passam por situação de ameaça.

Por outro lado, a gente considera como ambientalista o pessoal na luta contra a mineração. Aqueles na luta do Movimento Sem Terra estão muito nessa dinâmica de proteção ao meio ambiente. Os indígenas, os quilombolas, todos esses também considerados ambientalistas. Só que, independente disso, tem pessoas que realmente se declaram. Na verdade, são todos por essa indivisibilidade na defesa de direitos humanos. Se eu defendo uma terra quilombola, eu quero essa terra plantada, cultivada, mantendo a natureza; ou indígena também, assim como ambientalista, e principalmente os que lutam contra a mineração. É um número que vem crescendo no Programa, e nós sabemos que a tendência é aumentar a quantidade de pessoas que defendem a terra sem a agressividade da mineração.

Porque é o que a gente diz: a mineração é necessária, as coisas vão mudando. Agora, é essa agressividade com a natureza, as pessoas, as comunidades, e a gente não pode permitir que ela continue acontecendo da forma que está. E são muitos que são ameaçados, às vezes abandonam, saem do território ou vivem o tempo todo sobre os cuidados de pedir apoio para a polícia para uma proteção maior ou para que eles mesmos resistam no território; para garantir que eles mantenham uma vida com dignidade, tirando o sustento daquele espaço onde eles vivem e trabalham.

O entendimento do que são, de fato, direitos humanos talvez seja um conceito que não é claro para muitas pessoas. Então, como a educação poderia contribuir para a conscientização do que são os direitos humanos? 

JOÃO BATISTA:
Para que eu possa eleger pessoas que estejam mais adequadas, vamos dizer, a esse interesse [de promoção dos direitos humanos], eu preciso ter uma compreensão política também. Dessa forma, a educação em direitos humanos passa também por uma educação política, para que essas pessoas entendam que quando elas fazem uma escolha, isso tem consequências na vida delas.

Por essas dificuldades da própria educação, como não ter um ensino de qualidade ou não ter interesse em ter essa educação ampla, as pessoas seguem nessa disputa que estamos falando. Porque, ao mesmo tempo que tenho uma divulgação, por exemplo, daquilo que seria uma perspectiva ampla de direitos humanos, eu tenho outras vozes que continuam tratando através do entendimento de “defesa de bandidos”, defesa para os “humanos direitos”. Isso é uma restrição e uma disputa que acontece na sociedade. Por isso, é necessário uma política pública de educação em direitos humanos que congregue melhor isso. Para, num determinado momento, as próprias instituições se sentirem na obrigação de fazer.


Então, assim, como o Estado precisa ter políticas públicas para direito à educação, direito à saúde, o SUS é um avanço, claro que é, nessa gente pensa, nessa perspectiva, mas eu preciso aprimorar um pouco mais isso. Então, essa atuação do Estado é importante, [mas às vezes acho que] temos que diminuir a participação do Estado. O que significa diminuir o Estado? Significa privatizar, significa passar para a mão do setor econômico. Pra que? Pra que eles, o setor econômico, tenham mais lucro. Mas isso vai nos fragilizando. Se eu faço isso, a visão liberal fragiliza os direitos humanos.

Então, por isso que é tão importante a gente destacar e ressaltar a importância da educação de direitos humanos, porque só quando as pessoas compreendem que direitos humanos é tudo isso, direitos humanos não é isso que eles estão falando, às vezes falam de direitos humanos, não, direitos humanos é a defesa da educação, da saúde, isso é direito humano, direito a ter uma vida adequada, direito a ter o lazer, direito à liberdade também, direito a votar adequadamente, direito a tudo. Tudo isso é parte dessa questão dos direitos humanos. E é importante que as pessoas compreendam, se ela não faz escolhas adequadas para deputados, para escolhas políticas, isso, infelizmente, vai afetar nessa implementação dos direitos humanos.

Há muito o que se fazer para alcançar a efetivação desses direitos, como pontuado por João. Aos poucos, pequenas ações contribuem para o futuro. Além de projetos, o Instituto DH também realiza pesquisas para entender, por exemplo, os obstáculos que permeiam a vida das pessoas em situação de rua.

MARIA EMÍLIA:
É interessante que [dia 25 de julho] teve uma matéria no Jornal da Globo. O Alexandre de Moraes [Ministro do STF], não sei se você viu, proibindo que retirem os pertences dos moradores de rua. É a propriedade que eles têm, né? É o cachorro, é aquele carrinho que eles carregam as coisas deles. E isso não é respeitado. Eu não sei qual o tipo de instrumento foi publicado, de autoria dele, em que proíbe que sejam retirados os pertences [das pessoas em situação de rua]. O que a gente vê acontecer comumente, né? Em qualquer cidade.

E aí apareceu uma aluna da USP, ligada a direitos humanos, e diz que não pode privar o direito de uma pessoa. É óbvio, né? É a indivisibilidade. Porque se ela não tem um local certo onde mora, ela não vai poder ter um tratamento de saúde; porque ela não tem endereço, ela não pode matricular o filho na escola, por que qual o endereço que ela tem?

A interdependência desses direitos é fundamental para que a pessoa viva com dignidade, seja onde ela esteja vivendo. Há algum tempo eu até pensava assim: ‘mas morar na rua não dá pra ser, tem que retirar, tem que ter uma casa’; mas [na verdade] é uma opção. E ele chegou a esse ponto, morador de rua principalmente, por vários fatores da vida dele que fez com que chegasse a essa condição de vida. O Instituto fez uma pesquisa com os moradores de rua e os catadores de material reciclável. Muitos deles até tinham uma casinha, mas a casa não comporta pela distância, o local onde eles têm que trabalhar, então eles optam por morar na rua, é direito deles. Tem uma ala da sociedade que diz que a gente que defende quem mora na rua está errado, que eles deveriam ter uma casa. Deveriam, e às vezes eles até têm, mas qual a condição que eles têm de terem a casa onde é? Na localidade onde é? Para se deslocarem para trabalhar, para até manter as necessidades básicas deles, que são locais muito distantes.

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Produto editorial da disciplina
Laboratório Integrado II: Grande Reportagem, elaborado por estudantes do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto

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