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PraTodosVerem: A foto é uma montagem de elementos visuais que remetem a dados digitais. É possível ver a silhueta de um homem através de um quadrante que remete a uma tela. O rosto dele está coberto por códigos binários. Ao redor da tela há um fundo azul sombreado com linhas que remetem a placas de computador.

<arte> Cristiano Brito

DADOS HIPERVISÍVEIS

A transformação digital alterou a forma como lidamos com nossa identidade e privacidade, vulnerabilizando tanto influenciadores quanto anônimos

Beatriz Dantas, Cristiano Brito e Vinícius Pacheco

[Outubro, 2024]

As redes sociais on-line alteraram a forma como as pessoas se expressam, ampliando parte do que antes era exclusivamente privado para os holofotes digitais. Fotografias, vídeos e textos pessoais agora podem ser compartilhados em tempo real para milhares de pessoas. Os avanços tecnológicos possibilitam que as plataformas digitais se tornem um novo espaço para armazenar memórias, com cada conteúdo postado integrando um acervo público, acessível e sujeito ao julgamento alheio.

Quando falamos em tecnologias digitais estamos tratando de um tempo recente, ou seja, o fim do século XX e início do século XXI. Helena Mollo, professora de História da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e doutora em Teoria Literária pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), explica que popularmente entendemos que tecnologia remete à ideia do que é eletrônico, quando na verdade o termo é um conceito anterior à era digital e envolve tudo que se relaciona à arte, ciência, conhecimento e à própria escrita.

Álbuns fotográficos ainda são comuns, mas não são mais tão populares como costumavam ser. Para fotografar, de forma analógica, é preciso comprar filmes fotográficos que possibilitem bater uma quantidade limitada de fotos. Além disso, é necessário revelar essas fotos posteriormente, e isso também é pago. Porém, com a democratização da internet, a publicação de fotos on-line popularizou-se, o limite de unidades fotográficas foi quebrado e houve o barateamento das tecnologias.

Essas novas possibilidades aumentaram ainda mais a popularidade das redes sociais e fizeram com que muitas pessoas acabassem normalizando a prática de publicar fotos em grandes quantidades. Isso pode ser chamado de exposição digital, o que, de acordo com Carlos Frederico Cavalcanti, professor de Ciências da Computação da UFOP e doutor em Ciências da Computação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é “a divulgação de informações pessoais e comportamentais através de plataformas online na internet”.

Com o avanço da conectividade, o que antes parecia inofensivo evoluiu para algo mais complexo. Agora, as redes sociais e outros serviços coletores de dados afetam usuários de tecnologias digitais. “Usuários precisam ser informados e capacitados para entender as implicações de suas ações on-line e fazer escolhas conscientes. Entender e gerenciar a exposição digital é essencial para proteger a privacidade, a segurança e a integridade das pessoas”, explica Carlos.

Essa hipervisibilidade é, na verdade, um espectro de exposição e todas as suas categorias são suscetíveis à geração de dados brutos — ou seja, que ainda não foram quantificados/organizados, e, portanto, não produziram qualquer tipo de valor atribuído. No final dos anos 1980, com a popularização da internet, surgiu a World Wide Web (WWW), um sistema de recursos e documentos interconectados acessados pela internet, que revolucionou a forma como acessamos e compartilhamos informações. Esse avanço permitiu a navegação on-line e marcou o início da coleta de dados, como os endereços IP. Desde então, surgiram grandes buscadores e várias redes sociais, ferramentas que só aprimoraram a forma como se coletam os dados.

Com a era digital, muitas pessoas se empolgaram com os serviços gratuitos que foram disponibilizados on-line, como o armazenamento em nuvem e criação de contas de e-mail acessíveis. Porém, por trás dessa gratuidade, os dados dos usuários se tornaram extremamente valiosos. As big techs, como o Google, usam essas informações para obter insights e impulsionar seus negócios, à medida que avaliam o perfil dos seus usuários.

Para Carlos Cavalcanti, a coleta de dados ainda pode aumentar o grau de exposição para além do desejado, pois permite a coleta e o compartilhamento dessas informações com terceiros. Giuliano Penido, bacharel em Ciência da Computação pela UFMG e desenvolvedor de software da Localiza, complementa dizendo que o compartilhamento desses dados é feito entre grandes empresas e parceiros comerciais, e que em muitos casos não há o consentimento dos usuários das plataformas, o que viola as regulamentações de privacidade e acesso de dados.

Clébio de Oliveira Júnior, mestre em Ciências Naturais pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) e cientista de dados da Data Risk, explica que as redes sociais capturam dados passivos, como a quantidade de likes e a localização do usuário. Esses dados são utilizados para definir um nicho e otimizar estratégias de marketing pelas big techs, grandes empresas que trabalham com dados.

"[Isso é feito] através da quantidade de likes dos usuários, como por exemplo um jogo,
um estilo de roupa e etc. Outra forma é a localização em que o usuário está"

Clébio de Oliveira

Enquanto alguns permanecem no anonimato, consumindo e compartilhando informações sem se destacar, outros, como os influenciadores digitais, geram uma grande quantidade de dados. De todo modo, ambos produzem informações de valor para as big techs. A exposição digital, tanto voluntária quanto involuntária, está sempre sujeita à vigilância constante, pois as plataformas digitais coletam dados dos usuários em diversos aspectos da vida cotidiana. A diferença está na forma de uso: a exposição consentida ocorre quando usuários aceitam termos e fornecem dados ao criar perfis, enquanto a inadvertida acontece mesmo com acessos simples a páginas sem qualquer tipo de cadastro.

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O Instagram, lançado em 2010 e voltado para o compartilhamento de fotos, é um dos exemplos de uma rede social que lida com as duas formas de exposição de dados. Criar um perfil na plataforma exige preencher um formulário que autoriza a big tech Meta Platforms (fundada em 2004 como Facebook Inc. e reformulada como tal no ano de 2021) a coletar e usar dados dos usuários. Simultaneamente, basta acessar uma página dessa plataforma na internet, mesmo sem uma conta, para que sejam gerados dados sobre o tráfego e a localização dos visitantes.

[Direcionamento e prudência]

Isadora Lúcia Souza, 22, conhecida como Isalu, teve sua visibilidade ampliada no Instagram após ser coroada Miss Minas Gerais em 2023. Com uma trajetória que começou em 2018, ela navegou pela hipervisibilidade com consciência. 

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Isadora Lúcia

Juntamente com sua equipe de assessoria, a também graduanda em Jornalismo pela UFOP enfatiza a busca por representatividade racial enquanto mantém equilíbrio no compartilhamento de sua vida pessoal. Com uma abordagem voltada para a utilização positiva da exposição, a modelo busca inspirar outros e esclarece que ainda é necessário gerenciar com cuidado a privacidade.

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O YouTube, lançado em 2005, revolucionou o compartilhamento de vídeos on-line. Apesar de não ser uma rede de produção de conteúdos instantâneos e, consequentemente, captar menos dados em tempo real, se consolidou ao longo dos anos como um espaço muito popular de entretenimento.

Lucas Reichert, 28, jornalista pela Universidade do Planalto Catarinense (UNIPLAC) e criador do canal "Aprofundo", é uma das pessoas que escolheu trabalhar com a rede.

Em seu canal, Lucas aborda curiosidades do cinema, tv, música e afins. A pressão para manter a qualidade e a relevância do conteúdo, juntamente com a necessidade de proteger sua privacidade, reflete as complexidades enfrentadas por profissionais de mídia digital, demonstrando como a superexposição pode trazer oportunidades significativas, mas também exige um manejo cuidadoso para preservar a integridade e a privacidade.

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A responsabilidade de influenciar pessoa é gigantesca, e por isso faço questão de não chocar ou manipular informações, sempre priorizando a veracidade e a integridade do que compartilho.

Prefiro manter minha vida pessoal distante, o que ajuda a evitar situações desconfortáveis.

Evandro Fuzari também adotou o YouTube para a produção de conteúdo audiovisual, e experimentou uma forma diferente de superexposição. De maneira geral, para o youtuber, sua experiência com a popularização de seu conteúdo foi majoritariamente positiva, incluindo a resolução de seu objetivo inicial, o de fazer novos amigos. Embora tenha recepção cordial por parte de seus seguidores, ele enfrenta desconforto com a aproximação indireta através de sua família. Isso destaca uma faceta menos discutida da superexposição, em que a invasão da privacidade pode ocorrer não apenas diretamente, mas também por meio de conexões interpessoais.

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A vida pública mudou bastante minha vida pois transformei minha imagem em algo lucrativo para marcas e consequentemente para mim, até agora não tive qualquer malefício.

É comum procurarem membros da minha família para tentar ter acesso a minha pessoa hehe, apesar de parecer ser nada de mais, não gosto muito quando isso acontece.

[Estratégia e imprevisibilidade]

Outra rede social de audiovisual que cresceu nos últimos anos foi o Tik Tok. Lançado como Douyin na China, o Tik Tok foi renomeado globalmente em 2018 com o novo nome da marca. Focada em vídeos curtos, rapidamente ganhou popularidade entre usuários jovens. A viralização de conteúdo nessa plataforma é dinâmica e frenética, da mesma forma, seu algoritmo é alimentado pelos dados dos usuários com equivalente rapidez. 

Apesar de ser uma rede social composta majoritariamente por jovens e de produção de conteúdo voltada para o entretenimento, o Tik Tok também tem uma parcela de usuários mais velhos e interessados por temas diversos, como é o exemplo de Rondon Rosa Marques, 47, jornalista e criador de conteúdo nas redes sociais que lida com a exposição de forma consciente.

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Rondon Marques

Ele usa suas plataformas para discutir arte, política e questões sociais e observa que a visibilidade pode trazer tanto reconhecimento quanto vulnerabilidade, especialmente em relação ao etarismo e à recepção de conteúdo produzido por pessoas mais velhas. O jornalista evidencia como a superexposição pode estar atrelada a questões de idade e percepção, e como é crucial gerenciar a interação on-line de forma estratégica.

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Ana Carolina Ribeiro, 22, estudante de música pela UFOP e criadora de conteúdo, viu um vídeo sem edição viralizar inesperadamente, acumulando mais de um milhão de visualizações. Esse episódio exemplifica a natureza imprevisível das redes sociais e a superexposição que pode ocorrer de forma inesperada.

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Ana Carolina Ribeiro

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[Discrição e pseudoanonimato]

O LinkedIn, lançado em 2003 e disponível no Brasil desde 2010, conta com mais de 75 milhões de usuários no país. Elis Cristina Barbosa, 32, jornalista pela UFOP e radialista na Rádio UFOP FM, usa a rede social da rádio para promover o trabalho institucional, mas mantém seu perfil pessoal separado e restrito a amigos próximos. Em seu perfil privado, ela compartilha conteúdos variados, mas não foca em sua carreira.

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Elis Cristina

Elis relata que nunca sofreu pressão para misturar sua vida pessoal com a profissional nas redes sociais, nem se sentiu forçada a compartilhar mais do que gostaria para engajar sua audiência. Ela acredita que essa distinção ajuda a preservar a sua privacidade e evitar a superexposição desnecessária. Para Elis, plataformas como Instagram e X são desafiadoras devido à rápida disseminação de informações.

A radialista também defende a importância de diretrizes claras por parte das empresas quanto ao uso das redes sociais pelos funcionários tanto em perfis pessoais quanto profissionais. Isso ajudaria a nortear os colaboradores sobre os limites e cuidados necessários ao compartilhar conteúdo relacionado ao trabalho, além de garantir que as postagens sigam padrões de conduta previstos pela empresa. O posicionamento de Elis reflete a escolha de muitos profissionais que optam por manter uma clara separação entre a vida profissional e pessoal nas redes sociais. 

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Eu estou num momento bem low profile. Eu posto
pequenas coisas, frases. reflexões, memes. Enfim,
não sou muito ativa nesse perfil não.

Nunca me senti aprisionada em compartilhar mais
informações da minha vida pessoal para engajar o
meu profissional. Nunca teve essa cobrança; ninguém nunca me cobrou. Eu sempre fui livre para querer postar e repostar as coisas tanto pessoal quanto profissional.

A rádio tem um perfil oficial, que é o perfil que
responde pela Universidade, assim como a TV Ufop e o próprio perfil da Universidade. Então, esse perfil profissional que a rádio tem serve para difundir todos os conteúdos da rádio.

Nunca enfrentei nenhum tipo de consequência na
minha vida pessoal por conta de algo que eu
compartilhei nas redes sociais do meu trabalho.

Em 2016, o Instagram lançou sua nova forma de produzir conteúdos, os stories. A função segue o conceito do Snapchat, aplicativo concorrente lançado em 2011, que ficou muito famoso nesse período ao trazer a ideia de publicações curtas, que somem após 24 horas.

Lucas Alcântara

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Esse tipo de conteúdo se tornou ideal para produtores de conteúdos mais dinâmicos, como é o caso de Lucas Alcantara, 27, arquiteto pela UFOP e criador do perfil @janelasdeouropreto, que escolheu se expor nas redes sociais de forma diferente e enfrenta uma situação paradoxal. Mesmo que seu perfil profissional foque na promoção da cidade, para preservar sua vida pessoal, ele mantém uma vida pessoal reservada, compartilhando aspectos mais íntimos de forma esporádica. 

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Após 20 anos, o Facebook continua sendo o produto mais consumido da Meta ao redor do mundo, atingindo a marca de 1,8 bilhão de usuários ativos mensais, destacando o papel central das redes sociais na vida digital. A plataforma não divulga informações sobre a quantidade de usuários anônimos cadastrados, mas não é incomum se deparar com uma conta anônima. Mesmo com a falta de informações que quantifiquem esse tipo de usuário globalmente, o comportamento pode ser motivado por diversos fatores e um deles é o resguardo de seus dados pessoais. Apesar disso, “a Meta conhece os seus clientes através das pegadas digitais que eles deixam nos sites e aplicativos da empresa”, conta Gabriel Morgado, bacharel em Engenharia Eletrônica e da Computação pela UFRJ e pós-graduado em Cibersegurança e Governança de Dados pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). 

A exposição involuntária pode ocorrer quando dados pessoais são compartilhados sem o conhecimento do usuário através de vazamentos acidentais ou mal intencionados. Diego, 39, policial militar, adota uma postura cautelosa on-line devido aos riscos da sua profissão. Ele usa o WhatsApp normalmente, mas evita outras redes sociais e mantém suas contas sem seu rosto visível, incluindo o Facebook, para proteger sua privacidade. Diego é um exemplo de como a superexposição pode ser mitigada através de práticas rigorosas de segurança digital e seletividade no compartilhamento de informações pessoais.

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[Dados e LGPD]

A proteção de dados pessoais é uma preocupação antiga, que evoluiu com a internet. Em 1994, o navegador Netscape introduziu os cookies, arquivos de texto com pequenos fragmentos de dados para acelerar a navegação na internet e armazenar e rastrear informações dos usuários. Em 1996, motores de busca como Yahoo! e Altavista melhoraram a navegação, e o Google, fundado em 1998, consolidou a coleta e o processamento de dados para personalizar resultados e publicidade.

Em 2013, o analista de sistemas Edward Snowden revelou que a National Security Agency (NSA) realizava vigilância em massa, coletando dados de milhões de pessoas sem consentimento. Isso gerou um debate global sobre privacidade e influenciou a criação de leis de proteção de dados, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil. Instalada em 2018, a Lei nº 13.709/2018 regulou a proteção de dados pessoais no país, um problema que evoluiu mundialmente ao longo dos anos.

Gabriel Morgado, destaca que, desde a Roma Antiga, já havia práticas de proteção de dados, e a primeira legislação relevante surgiu na década de 1970, na Alemanha. Morgado destaca que a LGPD promove a conscientização dos riscos à liberdade, à privacidade e os prejuízos aos direitos individuais associados à violação ou ao mau uso dos dados.

"A legislação regulamenta as atividades de tratamento aplicadas sobre dados pessoais a fim de prevenir que, em função de alguma dessas atividades, alguma pessoa natural seja prejudicada"

Gabriel Morgado

A privacidade tornou-se uma preocupação crescente, especialmente após o lançamento do Google Street View em 2007, que coletava não apenas imagens, mas também dados de Wi-Fi, levantando questões sobre a coleta de informações. Além disso, plataformas como as redes sociais usam aprendizado de máquina e reconhecimento facial para analisar dados e personalizar conteúdo e publicidade. Para Jadson Castro Gertrudes, professor de Ciência da Computação da UFOP e doutor em Ciência da Computação pela Universidade de São Paulo (USP), tecnologias emergentes, como a inteligência artificial, têm o potencial de fortalecer a proteção de dados. 

Stuart Hubbard em entrevista para o site Information Age, conta que existe um estigma quando IA é relacionada com segurança de dados, mas que na verdade essa tecnologia pode ajudar através da detecção de ameaças cibernéticas, plataformas de análise de dados de segurança, resposta proativa a incidentes, análise preditiva de riscos e sistemas de reconhecimento facial para controle de acesso.

"Essas tecnologias poderão desempenhar um papel crucial na evolução da privacidade e na mitigação dos riscos associados à superexposição nas redes sociais."

Jadson Gertrudes

Gertrudes também menciona que essas tecnologias podem influenciar a superexposição de usuários por meio da criação de textos e imagens fictícias que podem promover uma falsa validação social. Os dados recolhidos, de acordo com a LGPD, devem ser também descartados em um prazo estipulado. O que não significa que as informações apuradas através desses mesmos dados sejam descartadas, uma vez que, quando processados, eles se tornam material para informações sociais massivas, como análises psicossociais.

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O debate sobre a espionagem destaca a importância da privacidade dos dados pessoais. Quando grandes empresas, como as big techs, acumulam informações de milhões de pessoas, elas ganham um poder significativo de influência e controle. Esse controle permite que essas empresas, junto com e-commerces e agências de publicidade, utilizem informações para obter vantagens competitivas e exercer um grande poder de influência social e mercadológica. O professor Jadson menciona também que as redes sociais, por exemplo, são projetadas tendo em vista a maximização do tempo de uso e o engajamento dos usuários, explorando vulnerabilidades psicológicas, como a necessidade de validação, por exemplo. 

[Comportamento Social]

Wagner Guilherme Silva, 29, doutor em Antropologia Social pela UFRJ, explica que o comportamento social é moldado pela imitação de comportamentos prestigiados, especialmente durante a infância. No Brasil, o mercado informal e precário, resultado de uma escravidão e colonização severas, influencia como as pessoas se relacionam com o trabalho. Isso cria uma oportunidade para figuras messiânicas nas redes sociais prosperarem, ao explorar essas dinâmicas sociais.

"A falta de regulação dificulta a identificação de informações falsas, à exemplo do X (antigo Twitter) no Brasil."

Wagner Silva

Laiali Chaar, doutora em neurociência pela USP, coordenadora e docente da pós-graduação da Universidade São Judas Tadeus (USJT), ressalta os impactos profundos da manipulação de informações privadas na psique humana. “O uso excessivo de dados pessoais pode aumentar a sensação de vulnerabilidade e violação entre os usuários, levando à redução da confiança nas plataformas que coletam essas informações”, explica. Laiali observa que essa percepção de violação pode gerar ansiedade e outras consequências psicológicas negativas. Além disso, a falta de transparência nos algoritmos que regulam o fluxo de informações pode distorcer a visão de realidade das pessoas, influenciando suas decisões.

Laiali também destacou os efeitos neurológicos da hiperconectividade. O uso constante de dispositivos móveis e da internet para armazenar informações afeta a capacidade do cérebro de reter dados e manter o foco. A neurocientista mencionou a pesquisa The internet, cognitive enhancement, and the values of cognition, de Richard Heersmink, publicada em 2016, que revelou que a dependência da tecnologia para memorização prejudica a capacidade de lembrar coisas simples. Além disso, a neuroplasticidade — que rege a maneira como aprendemos e processamos informações — é alterada pelo uso contínuo dessas tecnologias, provocando possíveis mudanças na estrutura cognitiva.

"pessoas que nasceram antes de existirem celulares, já percebem que está mais difícil memorizar telefones, datas especiais e nomes de conhecidos"

Laiali Chaar

De acordo com o professor Carlos Cavalcanti, o aumento das funcionalidades dos celulares e a popularização de smartwatches com sensores — que podem inclusive inferir as emoções —, além de assistentes virtuais e IA, transformaram a interação social. Esse fenômeno, chamado de “dataficação da vida”, traz benefícios como a personalização de serviços, mas também levanta preocupações sobre dependência tecnológica, desigualdade digital e privacidade. Empresas e governos podem prever padrões de comportamento, resultando em um controle social inédito. “É fundamental que a sociedade debata os limites éticos da dataficação, implementando políticas que protejam as liberdades individuais e coletivas”, conclui ele.

De modo geral a hipervisibilidade e as redes sociais se relacionam com a dataficação, pois é ela que nos insere num contexto em que a vida se transforma em dados. Embora pareçam amigáveis, as plataformas sociais constantemente expõem e vulnerabilizam os usuários, revelando detalhes sobre seus estilos de vida, mentalidade e comportamentos íntimos.

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Produto editorial da disciplina
Laboratório Integrado II: Grande Reportagem Multiplataforma, elaborado por estudantes do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto

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