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Vozes para semear o amanhã
Socióloga e ativista indígena Avelin Kambiwá fala sobre o enfrentamento à devastação minerária contemporânea
Letícia Freitas, Maysa Mendes e Sarah Couto.
Agosto de 2025

Avelin Kambiwá é mulher indígena do povo Kambiwá, ativista socioambiental e socióloga, originária do Alto Sertão Pernambucano. Desde 1986, vive em Belo Horizonte (MG), para onde sua família migrou em decorrência das secas que marcaram o Nordeste, principalmente nas décadas de 1980 e 1990. Essa “desterritorialização”, como denomina, foi fruto não só das mudanças climáticas, mas principalmente pela ineficiência de políticas públicas e sociais, como o acesso desigual à terra e à água.
Em Belo Horizonte, Avelin cresceu na periferia e, ao longo dos anos, buscou formas de manutenção da própria cultura, mesmo longe de seu território original. Nesse contexto, organizou uma rede de resistência indígena urbana, formada por pessoas desterritorializadas, assim como ela e a sua família. Hoje, aos 45 anos, segue engajada na articulação das pautas ambientais e é uma das principais vozes de enfrentamento à mineração predatória no estado de Minas Gerais.
No âmbito acadêmico, é formada em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Avelin também é mestre em Estudos da Ocupação pela Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da mesma Universidade. Em 2022, recebeu o título de Doutora Honoris Causa pela Faculdade Febraica.
Com grande força política e atuação nas lutas pela preservação do meio ambiente e direitos da população indígena em Minas Gerais, Avelin nos convida a refletir sobre os limites e impactos da exploração minerária. Além disso, aponta caminhos para a resistência e a construção de um futuro menos devastado, pautado nos interesses coletivos do nosso corpo-território.
Da falta de água
à morte dos rios
A gente vem de um território que não tem nada de água, onde a questão hídrica é muito séria. E vem para um território muito rico em água, Minas Gerais, que ao mesmo tempo está tendo suas águas destruídas pela mineração. É um contraste muito grande, na época do crime da Vale no Rio Paraopeba, em Brumadinho, aquilo me chocou muito.
Ver um rio daquele tamanho, com aquela quantidade de água e com a força que ele tem, ser destruído daquela forma, foi aterrorizante. Lá em Pernambuco já tinha o Rio Moxotó que já estava sendo muito agredido, mas não pela mineração. Era pelos cursos, pelas pequenas canalizações de água para irrigação dos grandes fazendeiros. Aqui a gente vê o rio ser assassinado por todos os motivos possíveis e sempre nessa justificativa do tal do progresso.
Avelin Kambiwá
O que fica quando a mineração passa?
O que fica é o prejuízo mesmo. Como Drummond já falava de Itabira, já via a sua própria cidade indo embora nos vagões de trem, é isso que a gente tá vendo. Mesmo que aqui em Belo Horizonte a gente veja só a Serra do Curral, tem toda essa região de Ibirité, da região metropolitana muito próxima e onde estão as nossas bacias hídricas, de onde a água vem.
Para as cidades que já estão com mineração mais intensiva há muitos anos, não tem desenvolvimento. Eles falam: “ah, mas a mineração gera o grande PIB, a mineração enriquece”. Não, isso é uma lorota que contaram para a gente, para os mais velhos, para os nossos pais e familiares, que gera emprego. No entanto, são empregos muito terceirizados e precarizados; a gente vê a quantidade de funcionário da Vale que morreu. Tanto não gera emprego quanto não gera lucro. O que deixa é o prejuízo e as crateras.
Além disso, não investe em outras áreas. A cidade fica completamente dependente da atuação minerária. Se a mineração vai embora, se ela acaba, a cidade não tem nenhuma outra fonte de renda, não investe no turismo, não investe na agricultura local, não investe em nada. É o prejuízo pelo prejuízo, não tem contrapartida justa. Tem um dado do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG) onde eles mostram que cidades com mineração tem 40% a mais de gasto em saúde pública. Teoricamente, ganha por um lado, mas você gasta muito mais.
Todo mundo fala assim: "Ah, vocês falam mal de mineração, mas tem o celular, anda de carro, anda de ônibus, precisa de metal". Claro, precisa, mas a quantidade que a gente já tem minerada é mais do que suficiente. O que tem de minério sobre a face da terra já minerado é o suficiente para a humanidade ter tempo de reinventar novas formas destes materiais que a gente tanto diz que precisa.
Mas mais do que isso, já que é essa questão da geração de renda para o próprio território, que seja então beneficiado aqui. Mas não, a gente manda para o exterior, para poder ser beneficiado lá e a gente vai e compra esse produto industrializado com o minério daqui, o ferro daqui. A gente precisa rever essa posição.
Infelizmente, eu não acho que a gente vai ter tanto tempo para isso. A gente está realmente acelerando o fim do mundo, como diz o Ailton Krenak. Era para adiar, mas nós estamos adiantando. Não tá adiando nada, tá acelerando o processo.
E não é só a mineração, mas a própria extração de petróleo na Foz Amazonas, aumentando agora com essa liberação; a própria PL da devastação deixando que qualquer tipo de mineração passe com mais facilidade que a gente viu, com o afrouxamento da legislação pelo [Governador] Zema. Em seguida a gente teve dois crimes ambientais, um atrás do outro, o crime em Mariana e o crime em Brumadinho. E tem a possibilidade de isso só aumentar. Teve a Braskem lá em Maceió, também mineração.
Avelin Kambiwá

A mineração tem várias formas de destruição e já provou, da pior forma possível, que a gente não é quem fica com lucro, a gente fica com o crime, com o prejuízo e com os corpos para contar.
Impacto para os
povos indígenas
Eu acho que o impacto é maior, porque a nossa relação com o rio não é essa relação do utilitarismo. É uma relação do sagrado, uma relação do avô, da personificação do rio. O rio é uma entidade, não é “o que eu preciso dele”, é quem esse rio é para mim, para a comunidade, para a nossa cosmovisão.
Quando você tira o rio, você tira uma parte dessa visão de mundo. É mais um atingido, é mais um que deveria ser reparado. A gente vê aqui o caso do Rio Watu (Rio Doce), do Povo Krenak, ou o Rio Paraopeba; não tem nenhum tipo de cuidado. As obras, por exemplo, para tirar a maioria dos metais pesados desses rios, não aconteceram. Então a gente não vai ter um rio de volta, não vai ter essa entrega para a população, não só para os povos indígenas, para ninguém.
Avelin Kambiwá
Desenvolvimento
para quem?

Talvez seja isso que a gente falta em nós, o verdadeiro patriotismo. Seria amar essa mátria, essa terra mãe e não vendê-la, não entregá-la, pensar como que a gente pode desenvolver aqui e parar de mandar matéria-prima, matéria-prima, matéria-prima.
Legislação e
governo local
Avelin Kambiwá
Da perspectiva da legislação a gente não vai ter muita saída não. Com a aprovação do PL da devastação, a gente tem leis mais frouxas. A licença, a maioria das licenças agora vai poder ser feita pela própria pela internet, de forma online, sem um estudo de impacto das obras, vai ser um salve-se quem puder.
Aqui em Minas, principalmente, já havia sido afrouxado pelo governo Zema. O Zema também tentou tirar a consulta prévia livre informada dos povos indígenas e quilombolas. Tirou, e aí com muita luta teve que reinserir a consulta prévia porque é uma normativa internacional. Reinseriu, porém a gente tem essa resistência de ouvir as comunidades atingidas. As comunidades que serão atingidas nos projetos.
Essa resistência vai vir do povo. Infelizmente, não vai vir do do setor do setor privado, que tem o interesse na mineração, não vai vir dos políticos, que têm interesse na mineração e não vai vir também da proteção legislativa, porque a legislação foi toda desconstruída.
Inclusive, eles insistem nesse discurso de que: “é bom para o município, bom para o povo, que gera divisas e que o município vai ficar rico”, mas o povo sabe. Em Itabirito, ali perto do [distrito] Bação, o povo impediu a construção de um terminal de minério porque sabe. E não precisa ser técnico para falar, vai ficar tudo vermelho, vai encher de poeira, é esse senso da própria realidade, da própria vida.

Todo mundo reconhece uma região devastada pela mineração. E ninguém acessa de fato esse dinheiro, esse tal desse lucro.
Esse é o discurso que os prefeitos e os governadores sustentaram por tantos anos para destruir Minas Gerais. Inclusive tentando tornar isso uma atividade histórica, sem ser histórico para nós. Histórico é o tropeiro, histórico é a dona lavando roupa na beira do rio, isso sim é histórico.
Mas eles tentaram criar essa narrativa de que Minas Gerais é a terra da mineração, que sem mineração, Minas Gerais não existe, e é justamente o contrário. Quanto mais mineração, menos Minas Gerais. A gente precisa ser “Águas Gerais” e começar a pensar em como a gente vai proteger as nossas nascentes e os rios que ainda estão vivos e cobrar da mineração, principalmente da Vale, BHP, Billiton e toda essa esses conglomerados aí de de que tem muito dinheiro que faça um projeto eficaz para recuperar o Rio Doce e o Rio Paraopeba, além dos outros. O próprio Córrego do Feijão mesmo [em Brumadinho], que foi o primeiro a ser destruído.

Que a gente possa despertar dessa grande mentira e sair desse lugar de minério-dependência e de destruição do nosso próprio território e nosso pertencimento. E eu acredito que o povo mineiro, desde os mais simples, mais antigos, até os mais jovens, universitários, estão começando a entender que a gente precisa cuidar do nosso território.
Entre discurso
e prática
Avelin Kambiwá
O Nego Bispo, falava isso: “Direita e esquerda são vagões do mesmo trem desgovernado”. Quem é do interior, quilombola, indígena, sabe muito bem que essa direita e esquerda, essa criação não faz sentido na nossa realidade prática. Para nós que somos do interior, o povo da roça, sempre teve os ricos e os pobres, peão e dono da fazenda, quem trabalha e quem manda, e não esse negócio de esquerda e direita. Essa é uma lógica muito europeia de entender política e a gente importou isso, dizem que é uma lógica francesa, aliás.
E para gente não, a gente sempre foi cercado dessas falas dos mais velhos, dos avós, dos nossos pais: “obedece quem tem juízo”, “manda quem pode”. Essa realidade do patrão, do dono da fazenda, do dono da empresa, do prefeito, do “coroné”, sempre foi muito real pra gente, a gente nunca foi representado, de fato.
Pensar que mesmo a gente tendo uma esquerda hoje que se elegeu com o discurso da proteção da mãe terra e do meio ambiente, da Amazônia, dos povos ali, o que eles têm de acordo com a mineração e com os setores do agro é muito maior, muito mais antigo e muito mais estruturado do que eles poderiam ter com qualquer um dos povos que vivem na terra, próximos da terra. Então, não existe um compromisso real conosco.
É só você seguir o dinheiro, quando você segue o dinheiro você entende qual é a prioridade daquele governo. Isso em tudo na vida. Na nossa própria vida pessoal, onde você gasta mais dinheiro? É na faculdade? Então, a sua prioridade tá ali. E se a gente seguir o dinheiro do governo Lula, a gente vai achar a prioridade no agronegócio, o plano Safra enorme e o setor minerário. O ministro de Minas e Energia é do PT, é da base do PT, ele é mineiro, inclusive. Infelizmente é uma posição de colônia histórica que direita e esquerda mantém o Brasil nesse lugar.
Expectativas para a COP 30
Avelin Kambiwá
Essa COP 30 marca um tempo de grande reflexão para a humanidade. A gente precisa aproveitar, inclusive, que a humanidade vai estar olhando para cá, para denunciar essa grande farsa. Para a gente falar: "olha, não tem transição energética nenhuma acontecendo. A Amazônia tem esse discurso de preservação, mas o desmatamento aumentou”.
A gente tem queimadas cada vez maiores no Pantanal. A gente tem aí o Cerrado no seu ponto de não retorno. A gente tem hoje na Caatinga regiões de semiárido, regiões de deserto que não tinha antes no Brasil. O Brasil não tinha deserto, tinha semiárido, mas não tinha deserto. Agora no semiárido tem regiões na Bahia que já desertificaram. Todos os biomas brasileiros estão em risco gravíssimo de colapso.
Eu vou para a COP mas falar da questão animal, que está totalmente relacionada, mas as pessoas querem desassociar. Porque se você tem a devastação por queimada, é o quê? Para criar gado. Para criar gado ou para plantar soja. E de novo o corpo-território, eu não posso achar que eu tô defendendo a Amazônia, se tão devastando a Caatinga e o Cerrado, é o corpo. Parou de chover lá, parou de chover aqui, não manda chuva para lá e mexe com tudo, tá tudo conectado.
Precisamos tirar essa venda dos olhos. E falar: "Olha, não tem COP 30, 35, 50, não vai ter como". A gente realmente tá num ponto de não retorno. E aí as pessoas acham que é uma conversa muito alarmista. Não é alarmismo, a gente teve no norte do país, secas horríveis no Rio Amazonas, rios gigantescos secando e agora transbordando. O Rio Grande do Sul passando por enchentes… mas parece que essas realidades vão passando despercebidas para a população em geral.
E é como se todo mundo tivesse acostumado a se reinventar. “ah, perdeu tudo”, mas aí trabalha, arruma de novo. E o pessoal fala isso até com orgulho: "nossa, tá vendo como a gente é um povo resistente?!”. Isso para mim são traumas coletivos que a gente compartilha e acha que tá tudo bem, perder tudo e construir tudo de novo. Não, não tá tudo bem. A gente não sabe lutar pelos nossos direitos e a gente não sabe reconhecer que algo está muito errado. Isso tem a ver também a forma que a gente foi colonizado, as violências históricas que a gente passou, principalmente as mulheres.

Não sobra força o suficiente para lutar para além de reconstruir a minha própria vida, a minha própria história.
Esses choques que a gente vai recebendo, século após século, quebram a nossa força de lutar de forma coletiva e a gente vai se tornando uma população de pessoas quebradas que vai se reinventando, tragédia após tragédia.
Resistir com o corpo-território
A única forma de proteger o território é com o corpo. E diante do embrutecimento das relações entre nós, diante dessa coisificação do outro, esse corpo que vai proteger o território vai ser tombado.
O agronegócio armado até os dentes, agro milícias armadas até os dentes. Como é que essa família de pequeno produtor vai resistir? Ela vai vender a terra. Vai vender para o fazendeiro de soja, vai vender para a mineração. Os vizinhos do lado começam a ficar com medo, começam a vender também. Quem quer ficar sozinho?
Assim começa a esvaziar as regiões de mineração, começa a esvaziar as regiões de água, de fonte, de nascente, cachoeiras. Se a gente não sair dessa falácia de que a mineração ela traz dinheiro, se a gente não se organizar e fortalecer as comunidades, fortalecer as organizações de bairro, as organizações de resistência, os movimentos, para não vender, para não entregar, a gente consegue.

Mas eles vão tentar de tudo fazer com que esse nosso corpo saia do território, porque saindo do território, aí sim, não tem Corpo-território mais para fazer enfrentamento.
E então a gente não tem nenhuma possibilidade de resistência mesmo.
Até onde vai a representatividade indígena?
Avelin Kambiwá
Além de ser um número muito pequeno, eu acredito que a gente foi amansado, o que Tuíra conseguiu sozinha com um facão para parar Belo Monte, a gente não consegue nem com um ministério mais. A gente não consegue. Porque aquilo ali era a força de um povo na força da terra, na força bruta de defesa de Corpo-território. Hoje nós fomos burocratizados, nós nos tornamos burocratas, ministros, e nós perdemos o poder de mobilização do povo.
E dividiu muito o movimento indígena. Eu até parei de ir a Brasília, começou a ficar penoso ficar lá no acampamento vários dias, alimentação precária, banheiro precário, instalação precária. Aí os políticos sobem no palanque, tem um showzinho, um Alok, e todo mundo ali completamente despolitizado, os jovens acabam ficando na gandaia, e não se faz proposta nenhuma. Nenhuma deliberação importante, desde quando a gente começou a fazer parte do governo, e isso aí ficou nítido. Eu mesma não me desgasto mais para essas situações, porque a gente enfraqueceu, ao invés de fortalecer. Além do que de novo, siga o dinheiro. O Ministério Público Indígena praticamente não tem verba.
Os limites da política institucional
Avelin Kambiwá
Fui candidata em 2022 e 2016, mas era uma coisa muito assim, de trazer a pauta indígena à tona, ninguém falava nada de pauta indígena em 2016. Eu fui a primeira candidata indígena a vereadora em Belo Horizonte, foi interessante, mas era uma coisa muito de despertar mesmo, não sabia nem como participava do direito dentro de um partido político partidário. A gente fazia a política da rua, das lutas. E aí 2022 de novo, para tentar trazer essa questão de Minas Gerais, fui candidata a deputada estadual, e aí que ficou muito escancarado que existe mesmo um limite do até onde você pode falar.
Houve um silenciamento muito grande, eu não podia falar de algumas pautas que pegavam no pé também da própria esquerda. Eu não tive o apoio que eu precisava e tive a candidatura boicotada mesmo, falavam que Minas Gerais não tinha candidatura indígena. Soltaram muitas fake news, onde tentaram colocar como se houvesse uma disputa entre a Célia Xakriabá que era [candidata a deputada] federal e a minha candidatura como estadual. Aí toda vez que a gente tinha que falar, tinha que fazer o letramento político, falar: "Olha, estadual é um cargo, federal é outro cargo, não existe essa disputa, nós somos parentes, estamos na mesma luta".
Houve muitas puxadas de tapete; e como na época eu tava no PDT, também teve uma desmobilização nesse sentido: “Ah, não, ela é contra o Lula”, a esquerda falava. Foi bem complicado, mas eu fiquei muito feliz que pelo menos a gente conseguiu ter uma deputada federal indígena, não só uma, como também a Juliana Cardoso, do PT de São Paulo. Como a Juliana não anda trajada, de cocar e tal, ela passa um pouco despercebida, mas é uma indígena do Mato Grosso do Sul, que cresceu em São Paulo. Do povo Terena, desterritorializado. E aí tem uns outros que se declararam também na época das cotas, mas ninguém sabe quem são essas figuras.
De qualquer forma, foi uma experiência importante, entender que eu tentei, vi como é o jogo de dentro. Entendi o tal do fogo amigo, que de amigo ele não tem nada, ele é só fogo mesmo. Entendi e falei: "Não, não dá. Eu vou voltar para a rua, eu vou voltar para a mobilização, organizar meu povo, organizar quem tá aqui, nos seminários, nos encontros, voltar para base e uma base que não tá acoplada à política partidária. Porque a gente de fato empobreceu muito no sentido de poder de luta”.
E como agir?
Avelin Kambiwá
Eu acho importante lembrar que, toda vez que a gente tá numa crise muito grande, podemos pensar nessa questão do corpo-território de novo. Quando uma pessoa está muito doente, normalmente ela tem um pico de piora. E ou ela piora para morrer ou ela piora para poder sarar, é assim que o corpo reage. Se estamos numa piora muito grande, a gente precisa entender esse momento no nosso corpo-território, e ou a gente se levanta para reagir ou a gente se entrega para morrer.
E eu acho que há pontos de resistência, apesar de não ter a força que a gente tem. O Ministério Indígena, o Ministério do Meio Ambiente, Direitos Humanos, todos esses ministérios não têm uma verba importante. Vemos aí que o compromisso não é conosco, não é com as mulheres, não é com os povos indígenas, não é com o povo quilombola, não é com o povo preto, não é nada disso.
Se a gente já entendeu não é por aí, que a gente possa pelo menos extrair o máximo de conhecimento e mandar para os territórios, extrair e aproveitar o máximo de emenda parlamentar, verba das universidades, seminários, congressos, o máximo que a gente puder, porque é única coisa que a gente vai ter.
Que seja daí a nossa saída de reorganização. Que a gente consiga se empoderar, tirando as verbas ainda disponíveis neste governo e aproveitar do pouco que tem para que a gente possa se empoderar para a luta que está vindo.

É isso. Ou a gente reage ou a gente morre. Estamos no ponto crítico desse corpo-território, fervendo de febre.
Durante a edição da entrevista, Avelin Kambiwá sofreu um grave acidente na BR-040, em Cristalina/GO, a caminho de um ato, no Distrito Federal, contra o PL da Devastação (PL 2159/2021). Além de Avelin, outras pessoas estavam no veículo e também participariam da mobilização. Após o acontecimento, o grupo foi socorrido e hospitalizado.
A equipe da 39ª edição da Revista Curinga lamenta o episódio e estima pronta recuperação a todos os envolvidos.